sexta-feira, 12 de julho de 2013

Audiência pública ouve relatos

de ex-presos políticos do período

da ditadura militar

Cynara Baum - MTE 14336 - 18:27 - 12/07/2013 - Foto: Marcelo Bertani


A Comissão de Cidadania e Direitos Humanos (CCDH) da ALRS, presidida pelo deputado Jeferson Fernandes (PT) em conjunto com a Comissão Estadual da Verdade, coordenada por Carlos Frederico Guazzeli, realizou a audiência pública “Trabalhadores gaúchos na resistência à ditadura: relatos à Comissão da Verdade”. A atividade foi realizada no Espaço da Convergência Deputado Adão Pretto, no térreo da Assembleia Legislativa.

Na abertura da audiência, Jeferson apresentou aos presentes um DVD, produzido por alunos da Unijuí, que ralata a história da ditadura militar no município de São Luiz Gonzaga.

No encontro, foram acolhidos os depoimentos de quatro ex-presos políticos da ditadura militar (1964-1986), o então secretário do sindicato dos portuários de Rio Grande, Antônio Nailen Espindola, os metalúrgicos João Batista Lopes e Orlando Michelli, militantes da VAR-Palmares, e Pedro Machado Alves, do PCdoB.

Depoimentos

O primeiro a depor foi Antônio Nailen Espindola, portuário aposentado, que trabalhou como estivador no porto de Rio Grande na época da deflagração do golpe militar de 1964. Na época era secretário do Sindicato dos Portuários. Foi preso em 06 de abril daquele ano, permanecendo detido por 18 dias no navio “Canopus”, de onde foi encaminhado para Porto Alegre. Também ficou preso no  SESME (atual prédio da FASE) até 02 de junho do mesmo ano.

Conforme Antônio, ele foi o primeiro a ser preso do seu grupo. Durante seu relato, um ponto que ele destacou foi o local por onde permaneceu com mais 22 presos políticos, durante cerca de 18 dias a bordo de um navio. Todos ficavam em um compartimento abaixo do nível do mar e respiravam por um exaustor, pois ficavam sem ar e quase sufocavam. De tudo o que passou, o ex-sindicalista afirma que a tortura psicológica era pior do que a física, não esquecendo das agressões sofridas. “A pessoa tava dormindo no chão e chegava um e dava um chute ‘levanta subversivo pra depor’, lembra.

O segundo depoente foi João Batista Lopes, operário metalúrgico (soldador) aposentado. Trabalhou na Wallig, indústria de fogões, participando da greve ali realizada em 1968, também trabalhou na Geral e no Estaleiro Só, todas de Porto Alegre. Ex-militante da VAR-Palmares, foi preso em 21 de julho de 1970, processado e mantido em prisão até dezembro daquele ano.

O metalúrgico aposentado relatou que participou da histórica greve da Wallig, que durou três dias. Foi demitido da empresa em decorrência disso. Quando ingressou na Estaleiro Só, conheceu o escritório de Carlos Araújo e começou sua militância em movimentos sociais, além do sindical do qual já fazia parte. Ele se orgulha em ter feito panfletagem em um evento do Estaleiro Só, em que os militares ficaram procurando quem estava distribuindo o material e não conseguiram descobrir. “Até hoje eu fico me tendo como um herói, porque via os milicos correr bem loucos na procura, pra mim foi maravilhoso, me sentia útil pra sociedade fazendo o que fazia”, afirma. João foi preso em casa, onde encontraram material da militância. “Levaram tudo que podiam, além do material da luta, meus móveis. Me bateram bastante e me jogaram no rio, eu algemado, me debatia um pouco, fui até o fundo duas vezes e voltei, até que me puxaram. A tortura continuou sempre. Mas eu não delatei um nome”, ressalta.

Na sequência, Orlando Michelli realizou seu depoimento. Ele é metalúrgico aposentado, na época do golpe era estudante de Ciências Sociais. Foi integrante da VAR-Palmares e detido por duas vezes em 1968. Após, também foi detido em 10 de maio de 1970, permanecendo em prisão até 13 de julho daquele ano.

Na época, Orlando trabalhava de dia e estudava a noite, e iniciou sua militância no movimento estudantil. Para ele, não tem o que pague as torturas e os suplicios vividos. “Ninguém sabe quais os reflexos disso na pessoa”, afirma. Michelli compara a forma de agir do período da ditadura com os dias de hoje. “Dentro dessa questão da tortura a ideologia da segurança nacional continua igualzinha, baseada nos moldes norteamericanos. Não podemos admitir que hoje, em um governo democrático, isso ainda continue acontecendo”, disse. Ele pediu a punição de todos que cometeram agressões e torturas durante o regime militar e afirmou que relatar o que aconteceu não os devolve nada.

O último a depor foi Pedro Machado Alves, engenheiro de segurança do trabalho. Na época do golpe era frezador, ferramenteiro. Foi sindicalista metalúrgico e militante do PCdoB. Pedro foi preso de abril a maio de 1969. 

Ele relatou que no período em que esteve detido, os policiais vendavam os olhos dos e faziam que iam atirar. “Meu grande medo não era de morrer, mas de delatar os companheiros”, afirma. Ele teve seus direitos políticos cassados até a redemocratização do Brasil, não podendo atuar inclusive no movimento sindical. Para Pedro, o principal foco da repressão era frear a luta sindical e operária.

Ao final do encontro, foi aberto um período para perguntas aos participantes. Um ponto comum entre os quatro depoentes, entre outros, foi a dificuldade em encontrar uma relocação profissional após suas prisões.

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